Pois, dei ali um saltinho a Portugal por uma semana. Fui num pé e vim no outro. A minha viagem é sempre muito emocionante e quando falo da viagem, refiro-me neste caso apenas à utilizacao dos meios de transporte. À ida é sempre uma desgraca, antes de embarcar fico vinte minutos presa no WC, tal é a forma como os meus intestinos absorvem o meu medo de andar de aviao. Especialmente sozinha. Tenho medo de nas descolagens, um destes dias agarrar no braco do meu vizinho de bordo ou desatar aos gritos, a dizer que preciso de um pára-quedas.
A viagem de ida correu sem grandes turbulencias, a uma hora boa do dia. Antes da aterragem, à medida que o aviao ia pairando sobre o Lisboa, o meu coracao emigra comecou a bater mais depressa, fechei as palmas das maos uma na outra e fui observando com uma alegria imensa o Atlantico, o Tejo, as Amoreiras, o transito que lá de cima parece tao fluido e organizado. Aterro com a mesma fome habitual, nao só da comida, mas das pessoas, do dialecto que falam, do cheiro do ar, da vida nas cidades em Portugal que é tanta comparada com a letargia do país das salsichas nesta fase do ano. Quando finalmente ponho o nariz fora do aeroporto, os meus sentidos todos despertam e sinto-me desperta e viva, pronta para comer, cheirar e ouvir todas as conversas à minha volta. E assim me deixo ir por maravilhosos sete dias.
No regresso, é tudo mais triste. Desta vez, o meu companheiro de lugar no Alfa pendular sentiu-se enjoado a viagem toda, tendo sido interpelado quatro vezes pelo revisor que tanto falava com ele, e tantas perguntas lhe fazia que eu estive perto de gritar cale-se-seu-parvalhao-que-ele-ainda-vomita-de-tanto-o-ouvir-falar-e-eu-tambem. Eu nunca enjoo de comboio, mas nem uma alminha bem artilhada de vomidrin® aguenta este cromo a falar da técnica com que se movimenta um comboio pendular e dos enjoos em pessoas com quebras de tensao, diabetes, de idade avancada, etc e se nao quer um chocolate, água com acucar ou ir morrer longe.
Chegada ao aeroporto, deparo-me com uma fila enorme de gente a passar no controlo de substancias ilícitas. Com embarque as 18:15, eram 18:30 e eu ainda nao tinha sido apalpada pela mocinha simpatica do controlo, com passagem especial pelo meu cinto e calcado, ou interpelada pela razao de levar quinhentas chouricas na mala de mao. Comecei a ficar ansiosa, com as palmas das maos húmidas e quando chegou a minha vez, já tinha tirado cinto, moedas dos bolsos, aneis, relogio e nem fiz a minha piadinha da prótese que nao tenho.
Já sentadinha no aviao e a precisar de Rexona em doses reforcadas, colei o nariz na janelinha minúscula tentando concentrar-me nas gotinhas de chuva que iam deslizando pelo vidro, levando outras gotinhas de arrasto, algo que sempre gostei de fazer quando estou triste. Acho que foi algo que me marcou num dis vídeos do Roberto Carlos dos anos oitenta, eu impressiono-me muito facilmente. O tempo lá fora combina com o meu estado de espírito e qualquer pessoa sente esta empatia da chuva, como se a Natureza e a minha alma se tivessem aliado.
A combinacao da tristeza e duma aterragem brusca - provocada por um piso alagado de água no aeroporto de Munique - fez-me comecar a pedir perdao baixinho pelos meus pecados e prometer nao voltar a andar de aviao sozinha. Chuif. De modos de que estou de volta... mas ainda triste e a afogar as mágoas em broa de milho com queijo e marmelada.
Relatos de uma Minhoca de sandália e meia branca
terça-feira, novembro 17, 2009
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4 comentários:
É uma sensacao estranha quando lemos algo de alguém que nao conhecemos e nos identificamos com a descricao de sentimentos na chegada a Portugal... já falta pouco mais de um mes para conseguir reviver isso tudo... :)
Yeah e verdade, so quem ta fora e q da valor acredita.
e uma sensacao tao boa...
CC
Sera que os emigrantes de todos os paises sentem o mesmo? Sera que um alemao a viver em portugal tera o mesmo sentimento em relacao a alemanha, ou de qq outro pais...Havera paises em que o desejo de voltar e maior, menor...? Ou tudo depende das pessoas? pelo que me apercebo entre os portugueses que estao fora o sentimento e a emocao do regresso e muito similar!
Vocês a querer vir e tantos a querer ir embora...pelo menos de férias, claro ;o)
Eu também fico com um nervoso miudinho ao andar de avião, mas o facto é que gosto muito. Principalmente da descolagem e aterragem.
Se a conversa do revisor tivesse sido comigo de certeza que lhe teria dito isso que pensaste, pois eu costumo ficar mal disposto, tendo de tomar sempre comprimidos para evitar enjoos.
Gostava de voltar à Alemanha. Conheço pouco. Apenas a zona da floresta negra e pouco mais.
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