Uma vez em cada tres meses, sofro dum ataque de hipocondríase. Mais tarde, consigo acordar do meu delírio, mas no momento, caio numa tristeza imensa, com um medo horrível de ficar doente com uma coisa grave e morrer quando ainda nao tive um filho, escrevi um livro ou plantei uma árvore.
A mente controla o corpo, dizem. A minha tem dias em que nao consegue. Caio no ridículo, mas é superior a mim. Depois, no meio de tantos possíveis cenários de horror, drama e desgraca, acabo por arrastar o meu rabo bolorento para o médico, até porque é já do outro lado da rua e dá tanto jeito. Ando desde Fevereiro com umas dores em torno do umbigo, tem dias em que a dor vem mesmo de dentro do umbigo, como se fosse possível o umbigo no seu papel de cicatriz, doer. É uma dor levezinha, na qual quase nem penso, mas sei que há vários meses que a adoptei e parece nao se querer ir embora, como que a lembrar-me que veio para ficar ou tao cedo nao se poe a andar. No meio do meu momento de melodrama e pena de mim mesma, digo ao Bola que nao me sinto bem e ele faz de conta que nao me ouve, como se tornou costume.
- Bola, sabes o que isto pode ser? Psicossomático! Relacionado com a recusa em nao querer abandonar o útero da minha mae. O cordao umbilical é o orgao que me ligava à minha mae e como mo cortaram, se calhar eu reajo agora assim por nao concordar com a separacao, por saber que nao consigo ser feliz para além da vida no líquido amniótico! É isso, é o desejo de regressar ao seio materno. Vou falar com a minha mae, pode ser que ela concorde.
Digo isto com um ar triunfante, com o mesmo ar com que provavelmente Einstein revelou pela primeira vez a teoria da relatividade. Felizmente o Bola nao me poe aquela camisa branca gira, na qual nao consigo mexer os bracos, mas aconselha-me a ir ao médico no dia seguinte, coisa que fiz. Só nao fui a um daqueles que comeca por psi.
Claro que quando la cheguei, o dr. Thomas fez aquele ar ó-nao-esta-gaja-outra-vez, mas eu nem lhe dei tempo para pensar em como me despachar depressa, comecei logo a debitar que já lá tinha estado em Maio e que ele me tinha feito até uma ecografia e bla bla bla e que uma dama nao pode ter tantos gases que provoque estas dores que nunca mais se vao embora. Afinal na Alemanha nem como castanhas. Claro que para ele nao achar que eu sou uma maluca completa, ainda fingi que tinha lá ido para controlar os valores da minha tiroide preguicosa e vai daí, ele sugere que a sua enfermeira brutamontes me sugue, para variar, 250ml de sangue para as análises do costume. Estava eu ja na marquesa com o fecho dos meus jeans abertos, a preparar-me para o toque das suas maos macias no meu abdómen, quando ele me diz por cima dos seus óculos, enquanto escrevinhava:
- Na, nao vale a pena. Isso nao deve ser nada, de qualquer forma, já que é pra tirar sangue vemos aqui mais uns valores.
Portanto, para quem esperava comecar o dia de uma forma um tanto quanto erótica, tive que me contentar com um comeco de dia mais pro masoquista, com os dois bracos picados e 250ml de precioso líquido a menos no meu frágil corpo de minhoca.
Relatos de uma Minhoca de sandália e meia branca
sexta-feira, novembro 30, 2007
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