Relatos de uma Minhoca de sandália e meia branca

sexta-feira, abril 20, 2007

Flossenbürg

Há uns dias, fui conhecer o ex-campo de concentracao aqui perto, em Flossenbürg. Estar num local destes perturba-me imenso. Como é que um sítio que foi palco do maior horror da história da Humanidade, é agora um Jardim que se pretende sereno, verde, cheio de flores? Tudo bem, é Primavera, mas o cenário nao pode revelar qualquer sinal de beleza, ainda que toda a gente saiba tudo o que se passou ali há umas décadas atrás. Acho que preferia que fosse um campo árido e nao tao aparentemente fértil.
Quando tinha 16 anos, na escola secundária ganhámos uma viagem a Estrasburgo à sede do Parlamento Europeu. Como ficámos uma semana em viagem, uma das visitas de estudo incluída no programa foi uma visita a um ex-campo de concentracao que agora, de cujo nome me voltei a recordar depois de fazer uma pesquisa na internet: Struthof.


Struthof

Ainda nao fui a Dachau. A Auschwitz muito menos.
Nestes dois campos que ja visitei, mantem-se o tratamento, as mesmas rotinas, a mesma brutalidade. A repeticao. Sistemático. Por todas as seccoes por onde se vai passando, lá está a explicacao comum a todos: a zona dos chuveiros, de onde a água saía gelada no Inverno ou a ferver. Todas as marcas pessoais dos presos eram eliminadas, cabelo cortado, roupa e objectos pessoais destruídos. A zona onde eles tinham de estar todas as madrugadas a ouvir os discursos do nacional socialismo, horas a fio, subnutridos. O registo de que muitos nem em pé se aguentavam, morriam ali mesmo. As camaratas, sem higiene, caldos de bactérias, propagacao de doencas. E depois o crematório. A entrada no cimo do monte, onde os corpos eram atirados, chegando cá abaixo apenas as cinzas.
Depois cada campo deve ter, imagino eu, a sua nota pessoal. Em Flossenbürg, os presos trabalhavam na pedra. Tinham de cortar (?), arrastar enormes blocos de granito.

Em Struthof, lembro-me de ficar perplexa quando depois de ver tantas coisas já tao horríveis, nos mostram a fornalha, onde as pessoas eram queimadas vivas. Uma cruelidade tao vil, que me faz desesperadamente querer acreditar que aquelas pessoas eram feitas de outra massa que nao a mesma que a minha,.
Temos em nós esta atraccao pelo horror, pelo mórbido. que ao mesmo tempo, nos perturba. Mas queremos ver mais, saber porque. Eu continuo a querer ir a Dachau. Sei que vou estar o tempo todo a engolir em seco, mas quero ir.
Espero é que desta vez, nao me saia uma tirada infeliz, daquelas (admito) em que nem penso e quando dou por mim, nao teve graca nenhuma. Depois de sair do campo, disse ao Bola - que maus que voces foram.
Nao teve graca. Eu ia detestar crescer com o estigma de que os meus antepassados foram responsáveis por algo além de horrível. Prefiro entao a nossa economia pobre, a corrupcao empresarial, o sistema do ensino superior que funciona na base do comércio.


Só me deu pra isto porque li que o Hitler nasceu a 20 de Abril...

3 comentários:

Anónimo disse...

Um belo texto Minhoca.
Como assídua leitora do teu blog e tendo eu no passado já me cruzado o alemão no masculino (incrivelmente, mais que 1 vez), sempre achei que eras uma corajosa por teres escolhido viver na alemanha. Eu receio bem que não fosse capaz.
Bjs
Alexandra - Coimbra
(xana2000_2000@yahoo.com)

Anónimo disse...

Diz o provérbio popular que "a montanha pariu um rato", que (confesso) nunca foi um dos meus preferidos.
Sorte teríamos nós se acaso este dia nunca tivesse parido nada, a não ser ratos. Mas logo tinha que parir esta ratazana mais repugnate (sem querer denegrir a imagem das ratazanas...) que existiu.
Se houvesse um programa para eleger o pior humano de sempre, acho que o Hitler ganharia de longe!
Sempre que penso nos campos de concentração lembro-me da descrição de Anne Frank que diz que as ratazanas comiam a carne das pessoas que, ainda vivas, caiam no chão sem forças e ali ficavam até morrer.
Maldito dia que trouxe à Terra pessoa tão desumana. Talvez por isso esteja a chover tanto por Lisboa. Até o tempo sabe que dia é hoje.

Anónimo disse...

Pior que ser vil e fazer coisas mal feitas,e saber que as estão a fazer e não fazerem nada para as pararem,assim que elas começam.A Europa e o resto do mundo é muito culpada dos genocidios que ainda hoje estão a acontecer no mundo.